terça-feira, 25 de setembro de 2012

Som, visão e persuasão: Primeiro ato

Em carne, osso e DVD no notebook.
   Opa, espera aí: Um homem no Dyke and Lady?
   Sim, sou Alaor Rocha, professor de inglês, cantor de karaokê e escritor no parceiro Mínima Ideia, e é um prazer estar aqui, estreando uma nova coluna no blog sobre filmes. Não, isso não está tão longe da proposta do Dyke and Lady, como você deve estar pensando: Muitos filmes — e seus respectivos atores — já foram responsáveis pelo modo como as pessoas se vestem e se comportam, e isso se repete até os dias de hoje. Um exemplo? Conhece Pulp Fiction, com Samuel L. Jackson, John Travolta e mais uma constelação de atores? Pois bem, se você usa esmaltes escuros hoje em dia, a culpa é da cor das unhas de Uma Thurman nesse filme. Isso sem falar na influência de Marilyn Monroe para a disseminação do estilo pin-up, no vestuário de Embalos de sábado à noite que ditou uma época e muitos outros fatos cinematográficos que estão entremeados em nosso dia-a-dia.
   Pois bem, espero ter-te convencido, pois estou aqui para analisar nada além da beleza dos filmes. Sim, a beleza. De um modo geral, claro: Seria muito fácil dar nota dez a uma obra estrelando o Johnny Depp ou a Malin Akerman se eu só avaliasse rostos bonitos. A coluna "Som, visão e persuasão" examina esses três aspectos de cada filme: Em "Som", a trilha sonora, sua influência nas cenas e a adequação do volume; em "Visão", os efeitos especiais, fotografia e figurino e, finalmente, a "Persuasão" é responsável por dizer, avaliando o enredo, as atuações e os díalogos, o quão convincente é a trama de cada longa-metragem e o quão longevo ele promete ser — ou seja, se ele conseguirá emplacar uma tonalidade de esmaltes na mulherada ou um topete no clube do Bolinha. No fim de cada postagem, também, deixarei o link para o download do filme examinado.
   Mas, claro, essas serão só minhas opiniões. As suas também serão muito bem-vindas nos comentários, e sim, talvez possamos travar algumas discussões cinematográficas por aqui!
   Já falei demais, não? Vamos logo para o que interessa.
   Boa leitura a todos vocês!


Filme: Cisne Negro (2010), dirigido por Darren Aronofsky e estrelando Natalie Portman, Mila Kunis e Vincent Cassel.

   "Inesperado", pensei ao me perder na tela branca no final de Cisne Negro. E não digo isso por causa do término: As quase duas horas de filme conseguiram, sem uma piada sequer, grudar meus olhos na tela sem pestanejar em momento algum. Não pude deixar de pensar em como os delírios de uma mente atormentada protagonizam as histórias mais incríveis com as quais já tive contato, e em como a verdade disso é tão tangível no universo perturbado onde Nina Sayers (a belíssima e convicta Natalie Portman) é obrigada a viver: Um mundo repleto de traições, alucinações e muitas, muitas frustrações.
   Tendo como pano de fundo a peça "O lago dos cisnes", composta por Tchaikovsky, a história de Cisne Negro é uma impressionante analogia à história do próprio balé — um pouco de atenção ao resumo que Thomas Leroy, o personagem de Vincent Cassel, apresenta ao início do filme é o bastante para entender a intersecção entre os dois roteiros. Nina é escalada para ser a Rainha dos Cisnes, o que a garante dois papéis protagonistas no balé. A incapacidade dela de representar o sedutor e maligno Cisne Negro, no entanto, faz com que ela tenha inúmeros encontros com uma personalidade escondida nos recônditos de sua alma e da qual ela não tem o menor controle. Ao mesmo tempo, essa pulsão dentro dela é o que a faz interpretar com maestria o malévolo papel, tanto na peça quanto em sua própria vida.

   Som
   A trilha sonora, obviamente, é uma adaptação de um dos grandes mestres da música erudita, então é indiscutível a qualidade dela. Existem, também, batidas dos Chemical Brothers que garantem verdade e modernidade ao mundo contemporâneo de Cisne Negro. Ao decorrer do filme, as perturbadoras reedições de Tchaikovsky expressam com vivacidade todos os dilemas de Nina enquanto se vê pressionada por Thomas e desencorajada pela mãe, Erica (Barbara Hershey), então não é difícil sentir-se dentro da conturbada mente da personagem da senhorita Portman enquanto "O lago dos cisnes" toma sua forma nos estúdios.

   Visão
   Inacreditável. Ainda me pergunto como foi possível a gravação das cenas do balé, que foram registradas do próprio palco e com incontáveis rodopios e vaivéns. Apesar de muitos momentos aflitivos, como as (até normais) cenas em que alguma unha de Nina racha ou quebra, a excitação dela nas cenas que envolvem sexo ou a mudança de semblante quando ocorre o flerte com sua outra personalidade é quase palpável de tão verossímil. As câmeras parecem reagir aos disparates da Rainha dos Cisnes.
   Isso sem falar do balé em si: Magnífico. Esmagadoramente real e dinâmico, e com certeza desperta em muitos a vontade de apreciar essa arte ao vivo, como despertou em mim. Cisne Negro, aliás, ganha muitos pontos por abordar o balé, que perdeu muito de seu reconhecimento nas últimas décadas, e revivê-lo com maestria em uma história de respeito. Mas só falo sobre o enredo no próximo item, não?
   Ah, antes que eu me esqueça de mencionar, os efeitos especiais são soberbos. Fazem parte da triste lista de spoilers, e por esse motivo não posso discorrer sobre eles, mas garanto que é a surpresa mais bem-vinda de todo o filme.

   Persuasão
   Desde seu lançamento, Cisne Negro já está sendo apontado como um promissor filme cult das próximas gerações. E por que não? As atuações são magistrais e repletas de personalidade — mesmo Beth, a ex-Rainha dos Cisnes interpretada por Winona Ryder, que tem um papel relativamente pequeno na trama, é notável do começo ao fim —, o enredo é envolvente e o desfecho, surpreeendente. Encontrar-se com "O lago dos cisnes" dentro de uma vida psicótica como a que Nina leva é deixar-se levar por uma comovente e agressiva viagem por um mundo nunca antes explorado dessa maneira. Além do mais, fez-me pensar sobre a real profundidade de histórias tão superficiais à primeira vista, como contos de fadas: Afinal, o que foi feito com o balé de Tchaikovsky não foi só uma adaptação na trilha sonora: Foi uma reinvenção. Redescobriram a América, redescobriram a Rainha dos Cisnes e, de repente, tudo ganha novos significados. Você se entrega ao Cisne Negro. Você deve se entregar a ele.

   Cisne Negro, lá no fundo, bem no fundinho, é um grito pela liberdade. Não há lesbianismo à toa, não há masturbações à toa, não há sangue à toa: Não há uma cena à toa nesse filme. Tudo transpira liberdade, tudo transpira a loucura que se torna uma vida encarcerada em tradicionalismos. É uma ótima pedida para qualquer um que deseja ver o mundo sob uma ótica diferente — sob uma ótica livre.

Download do filme (RMVB, dublado, 315 Mb)

2 comentários:

  1. Realmente, este filme me fez ver o cinema de uma outra forma, me fez ter um visão da qual não tinha ou não havia despertado dentro de mim, em primeiro momento não havia entendido o filme tive que assistir mas uma vez.
    Ainda mais com este texto apaixonante, ficara muito mas fácil de entender, muitos já assistiram, mas pouco conseguiram compreender a grandeza de traz desta peça.
    Fico muito feliz em ter você Alaor Rocha, em nosso blog, consegui ver atra-vez deste texto uma paixão incomensuravelmente pela arte.

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  2. Sinto-me lisonjeado com isso tudo, Patrícia! Espero mesmo que todos que leiam esses textos sintam essa paixão que você disse sentir, afinal arte nunca pode deixar de ser paixão em outras palavras.
    Muito, muito obrigado!

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