terça-feira, 23 de outubro de 2012

Som, visão e persuasão: Surpresa!


Filme: Looper — Assassinos do futuro (2012), dirigido por Rian Johnson e estrelando Joseph Gordon-Levitt, Bruce Willis e Emily Blunt.

  A indústria cinematográfica atual está perdendo credibilidade, por mais avesso que isso pareça. Na minha opinião, vender milhões com a adaptação de uma HQ ou de um desenho old-school não quer dizer sucesso absoluto dos estúdios hollywoodianos, principalmente porque não estamos vendo nada de novo sendo apresentado. O tão comentado Avatar (2009), como muitos não cansam de dizer, é simplesmente Pocahontas em live-action e só serve para destacar todo o poderio gráfico de que James Cameron tinha à sua disposição. De lá para cá, à exceção de poucos roteiros originais, os filmes que provocam desastres naturais nas bilheterias são incontáveis adaptações de livros, além do apocalipse super-herói provocado pela Marvel e das versões 3D dos clássicos Disney. E, em meio à minha chatice crítica, já não sou fã desses títulos que, de tão americanizados e forçadamente épicos, nem merecem a tradução de seus nomes. De verdade, precisava fazer Avengers — Os vingadores? Só o título em português bastava, e muito. O que eu poderia dizer de Looper — Assassinos do futuro, então? A mesma coisa, talvez. Mas me surpreendi.
  A não-tradução do título de Looper cai muito bem nesse longa, pois qualquer tradução dessa expressão soaria ridícula. Os loopers, no filme, são os assassinos de pessoas que voltam no tempo, criando um paradoxo temporal ou, melhor dizendo, um loop. Uma rotação temporal interminável, por assim dizer. (Imagine agora se o nome do filme fosse Rotacionador.) Em meio a um futuro próximo com tecnologias parecidas com a do mangá Dragon Ball, Joe (interpretado por um Joseph Gordon-Levitt a lá Três homens em conflito) é um desses assassinos que, caçado pela máfia em todas as intrincadas tramas clichês de dinheiro e reféns, acaba se mudando dos Estados Unidos para a China, fugindo dos mafiosos e continuando sua letal profissão, até, trinta anos depois e já com cara de Bruce Willis, ser rendido pelos asseclas do despótico criminoso Rainmaker e ser enviado à época quando o tirano era só uma criança — e quando o filme começa —, com o objetivo de ser morto pelos loopers. Só que, aproveitando sua estranha estadia no passado, o jogo vira e o velho Joe resolve caçar o pequeno Rainmaker para que o mundo do futuro pudesse estar a salvo. O único problema é que Willis não é o único Joe na jogada, e aí as coisas complicam para todos os lados.

  Som
  Não sei se sentei muito para frente na sala de cinema, mas nem mesmo Atividade paranormal 3 me assustou de supetão tantas vezes. Looper é barulhento e apocalíptico, com uma trilha sonora que acompanha a desordem e algumas músicas country bem atraentes para os momentos mais calmos. Só ainda não me decidi se todos os sustos foram propositais ou simplesmente volume mal equalizado.

  Visão
  Looper faz parte dos escassos longa-metragens de ação em que você consegue entender o que acontece nos tiroteios. Por mais vibrante que o filme pareça ser, ele tem menos cenas de ação do que o esperado, o que realmente não é um ponto ruim. É uma surpresa, e muito bem-vinda, pois o drama psicológico de Joe Willis e de Joe Gordon-Levitt ganharam um espaço mais do que merecido no longa.
  A caracterização dos personagens é outro ponto forte do filme: Bruce Willis é um ótimo Bruce Willis por todos os cem minutos, Joseph Gordon-Levitt é uma boa mistureba de Daniel Craig com Clint Eastwood, Emily Blunt (que interpreta Sara, a mãe do pequeno Rainmaker) é uma das mulheres mais fortes e seguras de si que já vi retratada em um filme e Jeff Daniels (o ator que faz o mafioso Abe) sabe como ser justo sem deixar de ser imponente. Isso também vale para a "Persuasão", sim, porém não posso deixar de dizer que a unicidade de cada um deles me fez pensar muito se Looper não é a adaptação de alguma história em quadrinhos, mas é um roteiro original. Ainda bem.
  Um post scriptum: Willis e Gordon-Levitt não têm muito a ver fisicamente para interpretarem a mesma pessoa, na minha opinião. Mas valeu a tentativa, (produtora).

  Persuasão
  O enredo surpreendentemente dramático de Looper me estapeou no rosto e me mostrou que, sim, personagens em filmes de ação estão longe de ser preto no branco. Cid, o Rainmaker criança (interpretado formidavelmente pelo pequeno Pierce Gagnon), por mais que você saiba que se tornará um ditador do crime no futuro, te conquista com sua simpatia e complexa história de vida. Enquanto isso, Joe Willis logo deixa de ser o herói do longa para se transformar em assassino impiedoso de crianças, e aí seu senso de moral embanana tanto que você deixa de rotular mocinhos e bandidos.
  As atuações são incríveis, o enredo também. Cai em alguns clichês, como o personagem de Pierce ter matado a mãe quando pequeno (lembrei-me de novo de Dragon Ball, já que Goku mata o avô em semelhante idade), mas reinventa-os na anovelada história do filme. Sua persuasão principalmente se dá por causa dessa reinvenção e do elemento surpresa: Você vai ao cinema ver um filme óbvio de ação futurista e se depara com um thriller psicológico onde a questão sci-fi fica em mero segundo plano — bem diferente d'O vingador do futuro, onde você assiste o que acha que vai assistir —, e é tarde demais para não ser pego nessa avalanche de descobertas.
  Continuando o post scriptum: O único problema da "Persuasão" é essa falta de semelhança entre Willis e Gordon-Levitt, que não convenceu em nada e me fez pensar que colocaram o Church d'Os mercenários em Looper só para faturar um pouco mais e gastar um pouco menos com tecnologias de envelhecimento digital.

  Ando chorão demais e engoli umas lágrimas no final desse longa. Não sei se todos filmes atuais estão tentando comover, de um jeito ou de outro, mas Looper alcança esse objetivo, pelo menos. É uma trama palpável, humanizada, sem heróis e vilões. O bem e o mal se revezam constantemente e, por mais difícil que seja acompanhar o início do filme, tão cheio de reviravoltas, viagens no tempo e tiroteios, logo tudo se coloca nos devidos lugares e você tem um dos mais interessantes roteiros cinematográficos originais de 2012.
  E é claro que não há link para download, o filme foi lançado há muito pouco tempo. Aproveitem que as salas de cinema estão esperando por vocês! (Mas prometo que em breve colocarei um link, tudo bem?)

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Som, visão e persuasão: Um entre muitos



Filme: A órfã (2009), dirigido por Jaume Collet-Serra e estrelando Vera Farmiga, Peter Sarsgaard e Isabelle Fuhrman.

     É complicado avaliar a beleza de um filme de terror, principalmente um tão bizarro como A órfã. A bizarrice desse longa, contudo, diferente da série do boneco Chucky ou do contorcionismo de Regan em O exorcista, é tão coesa e convincente que quase me obrigou a escrever sobre ele. Assisti A órfa pelo menos cinco vezes — no mês em que o MaxPrime simplesmente passava esse filme todo santo dia —, e ver como o enredo se encaixa de modo sensacional em meio às atitudes da abominável Esther Coleman, a garotinha que intitula o filme, me impressionou como nunca antes.
     Quase como O chamado, essa obra de pouquíssimo mais do que duas horas é um suspense carregado de doses fortíssimas de horror e sustos. Atrás de todos os rostos pálidos e gritos desesperados existe uma história cativante e muito bem engendrada em toda sua extensão, que começa quando John (interpretado por Peter Sarsgaard, que sempre vai me fazer pensar no Jack Bauer) e Kate (a personagem de Vera Farmiga), após a sua terceira filha morrer no parto, resolvem adotar uma criança. por sua peculiar inteligência e tino artístico, Esther (a enigmática Isabelle Fuhrman) é escolhida para completar a família, que ainda conta com um filho hiperativo e totalmente repulsivo à órfã e com uma pequena filha com problemas auditivos e graciosa como a Alice de Lewis Carroll. Mas, claro, como todo bom filme de terror, coisas estranhas começam a acontecer assim que Esther é colocada sob o mesmo teto da família Coleman. O único porém, julgo, é que em A órfã as coisas que acontecem são realmente estranhas. E convencem, viu? Todo detalhe é importante nesse longa. Todo.

     Som
     Não, A órfã não conta com aquela trilha sonora cheia de metalcore da série Jogos Mortais e de Freddy vs. Jason. O clima soturno do enredo impede que qualquer tipo de animação entre pelas janelas da casa de Esther, deixando todo o longa em tranquilo horror. Não é impressionante e passa despercebida pelo filme (a não ser nas cenas de susto, quando aquele estampido genérico surge para que o efeito do pavor seja triplicado), então nem vale a pena perder tantas palavras por aqui.

     Visão
     Só que a visão de A órfã traz a diversão que você precisa em um filme de terror. O efeito utilizado na introdução e nos créditos — imagens que são transpostas por outras sob luz negra — é uma adição muito condizente com o enredo que dá um charme especial a essa produção da Warner Bros. (sim, como você imaginou, o logotipo da Warner também é afetado por esse efeito.)
Além disso, a fotografia das cenas se utiliza de muitos clichês de filmes do gênero, como reflexos e ambientes desconfortáveis, mesmo fora de situações de horror. A tensão do filme, então, é reforçada por cada um desses momentos em que você espera que algo aconteça... e nada acontece. E, de repente... nada acontece mais uma vez. E BANG! Esther ataca mais uma vez! Os sustos que A órfã proporciona são justos e coadjuvantes, de modo algum estragando a experiência repleta de detalhes. São bem-feitos mesmo assim. E assustam.
     Um último adendo: A maquiagem para Isabelle se tornar Esther é inacreditável de tão realista. Meu queixo ainda não voltou ao lugar desde que descobri que a atriz, à época, era uma garota de onze anos.
     "Ué, mas ela não é uma pré-adolescente no filme?" Pois é...

     Persuasão
     A primeira cena do filme — Kate dando à luz um bebê morto e irresponsavelmente ensanguentado — garante que os minutos restantes de A órfã sejam mantidos na mesma pressão emocional. Os detalhes, como não cansei de citar por toda essa resenha, são igualmente convincentes e utilizados com maestria. Nada fica subentendido: Tudo acontece às claras do espectador, que consegue entender sem maiores delongas o inferno que a vida do casal Coleman se torna no desenrolar do enredo graças às horrendas travessuras de Esther. E isso é um ponto altíssimo. O filme flui com facilidade, como se você não precisasse forçar seu cérebro além das duas horas que englobam a história.
     As atuações são incríveis, também. A implosão da relação entre os personagens de Peter e Vera é absurdamente bem retradada: Você entende os nervos à flor da pele de Kate assim como você entende o estresse de John, e você quase salta dentro da televisão para esganar Esther. Duvido que você não vibrou/vibra quando Kate estapeia a personagem de Isabelle Fuhrman. Eu vibro toda vez.

     A órfã surpreende como filme de terror. Vai um pouco além disso — um pouco só, mas vai — e prende a atenção do espectador com um enredo muito bem engendrado e trabalho artístico impressionante. É perturbador, comovente à sua maneira e consegue emplacar Esther como um dos mais novos mascotes desse gênero, sentada ao lado de Michael Myers e da marionete Billy. Um mercado saturado como esse, no entanto, talvez não tenha dado muito espaço para que A órfã brilhasse com mais intensidade, o que não me impedirá de assistir esse filme muito mais vezes e pensar como ele deveria desbancar muitos longas nonsense e pseudo-trash que produtoras folgadas estão lançando sem pausa. Altamente recomendado para quem quer ir além de sustos e gritos em uma história apavorante.

Download do filme (RMVB, dublado, 400 Mb)

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Som, visão e persuasão: "Encandesplendoroso!"


Filme: Moulin Rouge - Amor em vermelho (2001), dirigido por Baz Lurhmann e estrelando Ewan McGregor, Nicole Kidman e John Leguizamo.

     Ah, um clássico. É praticamente impossível um musical não ter altos níveis de beleza, claro. Moulin Rouge, no entanto, transcende a maioria dos musicais aos quais estamos acostumados pelo arrebatador roteiro por trás das canções, que faria sucesso igual em um filme, digamos, convencional. Nunca — nunca mesmo — iremos cansar de histórias de amor, e a intrincada e fluente trama entre a cortesã Satine (a exuberante Nicole Kidman) e o miserável boêmio londrino Christian (o impecável Ewan McGregor, um dos meus atores preferidos, por sinal) dança e canta pelas duas horas com uma leveza inigualável.
     Tudo acontece na Paris do fim do século XIX, efervescente época cultural na Europa. Àqueles anos, a cidade borbulhava de artistas que cansavam de versar sobre suas sempre inacabadas obras e também de bordéis e prostitutas em todo e qualquer beco escuro. O Moulin Rouge, nesse panorama, era a grande atração pirotécnica e artística, que atraía toda essa casta artística que esperava sua chance para fazer sucesso (entre esses artistas está Henri de Toulouse-Lautrec, caricata figura histórica interpretada por John Leguizamo que, na vida real, utilizava o também histórico Moulin Rouge como grande inspiração para suas pinturas). Sua cortesã principal era Satine, que já não queria mais seguir tal carreira e gostaria de se empenhar como atriz. Seguindo seu sonho, acabou, em vários desencontros e confusões, encontrando Christian, escalado como escritor de um espetáculo que, graças a todo esse tumulto, seria financiado por um duque para que fosse apresentado no próprio Moulin Rouge, quando ele deixasse de ser um bordel para se transformar em um teatro. O conturbado amor de Satine e Christian é marcado pela obsessão do duque pela meretriz, pela iminência do espetáculo e por inesperados desmaios da personagem de Nicole Kidman, que logo fazem com que a anovelada relação se torne proibida e, logo após, inviável. Mas o que é impossível para a geração boêmia de 1899, que acredita, acima de tudo, no amor?
     Para Christian, o amor é como o oxigênio.

     Som
     Não existe trilha sonora melhor. Adaptações perfeitas de Nirvana, David Bowie, The Police, Whitney Houston e Queen, mescladas com canções próprias, são o ápice de Moulin Rouge. O trabalho feito em cada uma delas, injetando estilos musicais como o can-can e o tango em excelente harmonia com o rock n' roll e com boas doses de música eletrônica, simplesmente dão um tapa na cara de musicais que só se prontificam a copiar toda a estrutura da música e colocá-la em uma voz teatral. Moulin Rouge mostrou como que se inova em musicais.
     Destaques? Muitos: "Lady marmalade" é o hit radiofônico do filme que você provavelmente já ouviu e com o qual aprendeu francês pela voz de Christina Aguilera, P!nk e outras cantoras, ou vai me dizer que você nunca disse "voulez-vous coucher avec moi"? "El tango de Roxanne", tendo como base "Roxanne", do The Police, é a adaptação mais original e que dá o ar da graça no momento mais tenso de todo o filme. Por fim, as breves participações de Kylie Minogue e Ozzy Osbourne ajudam a enfeitar a trilha sonora e deixá-la bonita e brilhante como uma árvore de Natal decorada.

     Visão
     Bipolar. Em um momento você se vê no apartamento velho de Christian, em uma quietude visual quase monástica, e no outro você vê dezenas de prostitutas maquiadas pulando ao som de "Smells like teen spirit". Você acaba se acostumando com isso, mesmo assim. Você entende que a vida de Christian funciona nessa bipolaridade visual, então não se torna exatamente um problema na fotografia do filme.
     O ponto realmente relevante é o figurino e a maquiagem. Bataclã é para os fracos: O Moulin Rouge borbulha em roupas espalhafatosas e detalhadas como um vaso chinês, tanto nas cortesãs como no elenco teatral. Mesmo em momentos menos turbulentos, como quando Satine se produz mais para se encontrar com Christian ou com o duque, o trabalho visual é algo incrível, e Nicole Kidman fica cinco vezes mais bonita a cada cena em que aparece. Os cenários também são dignos de menção, tão brilhantes e meticulosos quanto as roupas. Destaque para o Elefante, o especial quarto de Satine onde ela leva seus gentis cavelheiro, tanto interna quanto externamente. É o tipo de lugar onde um fotógrafo poderia fazer centenas de ensaios sem nunca se cansar.

     Persuasão
     Não é difícil acreditar no sofrimento de Christian. Satine escorrega de suas mãos por todo o Moulin Rouge, então com uma hora de filme você já sente pontadas no coração iguais às que o personagem de Ewan McGregor sente. Além disso, os personagens são repletos de características marcantes que os transformam em caricaturas genéricas do que são: Uma prostituta infeliz em seu trabalho, um artista boêmio tentando se encontrar em um continente cheio de reviravoltas, um duque rico que está acostumado a comprar o amor. Algo bem característico em peças teatrais e musicais, o que faz Moulin Rouge não perder sua verdade.
     A persuasão se faz nas músicas emotivas, como "Come what may" e "Elephant love medley", recitadas por todo o filme. É nelas que você entende a mensagem que o longa quer passar para todos nós: "O amor superando todos os obstáculos", como Christian diz. Tudo bem, amor é e sempre será um tema batido, mas eficiente até demais se usado com maestria. Isso acontece em Moulin Rouge, que comove em meio a situações engraçadas e complexas. É um espetáculo, não? Um espetáculo que gira em torno de uma mensagem, algo tão característico quanto os personagens estereotipados, e por isso as duas horas de Nicole e Ewan valem a pena.

     Moulin Rouge não enjoa. É uma história de amor que todos gostariam de assistir, por ser tão verdadeira e tão emocionante. A parte boa? Sim, vou estragar porque esse filme já tem mais de dez anos: O final não é feliz. Ou é? Bem, ele não é o final mais convenientemente feliz que se pode esperar em um romance, e isso — a falta de convencionalidade — me agrada por demais. Esse filme merece ser assistido (e, principalmente, ouvido) muitas vezes por toda uma vida, para que todos os detalhes sejam entendidos em sua completude. E, afinal, todos nós precisamos, em toda a vida, de um empurrão para que não deixemos de acreditar na verdade, na liberdade, na beleza... e no amor.

Download do filme (RMVB, dublado, 418 Mb)

Posfácio: Estou muito óbvio nessa coluna, só colocando filminho bonitinho e cheio de dancinha. Pode deixar que semana que vem eu surpreendo vocês, beleza? Até lá!